Este artigo foi escrito por Rafael Borges, em representação da união de diversas organizações não-governamentais de Nova Friburgo-RJ que participaram da COMUNISEG no mês passado.
É compartilhando de todas essas considerações que a coordenação da Central Única das Favelas de Nova Friburgo-RJ, publica:
"Aconteceu em 25 de julho do corrente, no auditório da Queijaria Escola, a 1ª Conferência Municipal (Livre) de Segurança Pública. O evento esteve inserido nas iniciativas do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (PRONASCI), do Ministério da Justiça.
Tratou-se de uma etapa preparatória à 1a Conferência Nacional de Segurança Pública, a se realizar em agosto próximo, em Brasília. Apenas pela boa organização estrutural a Conferência mereceria elogios. De resto, mais pareceu um seminário de pseudo especialistas muito distantes da realidade friburguense. Não houve espaço para debates ou participação popular.
A começar pelo local escolhido para sua realização – símbolo maior do mito da Suíça Brasileira – a Conferência nem tentou esconder o perfil autoritário e elitista do governo municipal que a promoveu. Na platéia, quase todos engravatados, muitos oficiais da Polícia Militar, meia dúzia de políticos e uns poucos assessores. Alguma representação da sociedade civil organizada; nenhuma associação de moradores; nenhum partido político. Ambiente decorado, recepcionistas sorridentes, chuva, muito frio, clima europeu: até o prefeito, na sua fala inicial, evocou a finesse do povo francês e, contrapondo-a às hostes latinas, pontificou que não é possível dissociar segurança de educação (no sentido de polidez) e cortesia.
A partir daí, com o belo exemplo do chefe, os simplismos se avolumaram em progressão geométrica. Puseram até oficial do BOPE (isso mesmo, com caveira no ombro!) para falar de ação social, como se a intervenção daquela unidade na favela onde está sediada pudesse colocar uma cortina de fumaça sobre a política de “derramamento de sangue” que o Caveirão (desculpe, o Batalhão) executa. Nenhuma palavra sobre violência policial. A todos só interessavam ações de combate ao inimigo, o periférico de sempre que insiste em sobreviver nessa sociedade desumana e capitalista.
Diz-se seminário o evento realizado porque só os palestrantes falaram, e falaram e falaram... A participação da sociedade civil se restringiu ao envio eletrônico de princípios e diretrizes, cujos conteúdos, caso fossem lidos e considerados pela organização, certamente imporiam outro norte aos trabalhos. Sobraram policiais na Mesa. Faltaram sociólogos, advogados, comunicólogos, psicólogos, médicos, assistentes sociais, militantes de direitos humanos e outros profissionais para os quais a violência é um problema complexo, que demanda múltiplas e simultâneas intervenções. Caímos no beabá da repressão. Aquele que esperneia pelo aumento do efetivo policial, pelo aprimoramento da intelligentzia e pela neutralização do agente criminoso. Aquele mesmo que não deu certo nos Estados Unidos, na Colômbia ou no Rio de Janeiro. Pode ser que funcione em Nova Friburgo.
Apesar de reconhecida como um problema da segurança pública municipal – a ponto de diversas instituições já terem se mobilizado em torno da questão – à Casa de Custódia não foi dedicado um minuto sequer. Imperou o autismo. “Isso é problema para outra reunião”, teria dito uma autoridade local. Talvez ele queira tratar da Casa de Custódia na Conferência Municipal de Esportes, ou de Saúde.
Todavia, não dá pra dizer que deixou de ser uma lição. Aprendemos que às vezes cidadania não combina com Poder Público. E que políticas públicas podem ser construídas com autonomia. Aprendemos “como não fazer uma conferência”. E que em Nova Friburgo ainda tem gente pensando a cidade com grandeza, seriedade e espírito público. Dedico este artigo, que subscrevo sozinho, aos companheiros do Instituto Girasol, da 9ª Subseção da OAB/RJ e da CUFA/NF, agentes de transformação que carregam todas as minhas esperanças."
Texto de Rafael Borges
rafaelborges@nb-advs.com.br
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